quarta-feira, 23 de setembro de 2009

:)

:)

quarta-feira, 6 de junho de 2007

O grande precursor da gravação musical profissional mineira

por: Flavia Brandão e Mariana Renan

Um muro coberto de heras, na rua Afonso Alves Branco, 167, bairro Serra, em Belo Horizonte, esconde um lugar cheio de histórias para contar . Quem por alí transita nem imagina que por trás daquela aparente casa, se esconde o primeiro estúdio de gravação profissional de Minas Gerias: o “Bemol Studio”. Completando 40 anos de sua existência, o Bemol mantém sua chama acesa graças a seu idealizador, o engenheiro de som Dirceu Jorge Cheid. Com setenta anos de idade, o “Sr Dirceu”, pode ser considerado o grande precursor da gravação musical da capital.

Nascido em Belo Horizonte, Cheid sempre esteve ligado ao ramo da música. Antes mesmo de abrir a Bemol, já trabalhava com gravações, indo semanalmente a São Paulo e alugando um estúdio, a Gravodisc. Com a companhia do sócio, Célio Gonzaga, Dirceu viajava com seu fusca, enfrentando riscos, sem contar o cansaço e a saudade da família. Ele conta que construir um estúdio em BH, foi mais do que uma vontade foi uma necessidade. Recém-casado, com dois filhos, ele não viu outra solução.

Inicialmente, Cheid afirma que encontraram empecilhos. Mas isso não os fez parar. Ele e seu sócio procuraram suporte técnico e, em 66, conheceram o engenheiro Sérgio Lara Campos, que os orientou na compra do equipamento e no projeto de instalação acústica da Bemol.

Com os investimentos, o estúdio acabou se tornando uma gravadora de referência e descentralizando a gravação musical além do eixo Rio-São Paulo. “Como havia pouco estúdio no país, isso obrigava o músico, que não se residia em Minas a se locomover até Rio e São Paulo. E nos naquela ânsia de nos tornar uma grande gravadora começamos a investir e chegamos a gravar todo mundo que estava em atividade naquele momento”, afirma Dirceu.

Pela Bemol já passaram grandes nomes da música brasileira como: Milton Nascimento, Clara Nunes , Chico César, Trio Amaranto, Tavinho Moura, Patu Fú , entre outros. Até mesmo o presidente Juscelino Kubitschek , já deixou o registro de sua voz na abertura de um LP gravado na Bemol. “ Logo no primeiro ano de atividade do estúdio em 67 , nos conseguimos trazer o presidente Juscelino Kubitschek. Ele sabendo da gravação do disco “Diamantina em Serenata”, logo se prontificou em fazer a abertura e redigiu um pequeno texto de improviso. O disco teve uma repercussão nacional, porque naquela época, mais do que hoje o JK era um grande ídolo”, conta Cheid.

Além de memórias a Bemol guarda raridades como os microfones valvulados ELA M251. Fabricado em 1958 esse microfone, é conhecido por ter sido usado por lendas da música como Frank Sinatra . Tida como uma “joia rara”, senhor Dirceu conta que é comum nas gravações que são feitas na Bemol e finalizadas em São Paulo os técnicos de som se assustarem com a qualidade de voz. “A Fernandinha Takai do Patu Fú , no coquetel de lançamento no Rio , nos contou que o Caetano Veloso chegou e perguntou “ que voz é essa ? O que vocês arrumaram?” E a culpa realmente é dessa jóia rara aqui”, conta Dirceu apontando para o microfone.

Hoje, Sr.Dirceu se orgulha do patrimônio que conserva, e afirma que a Bemol se tornou uma grande família, pois seus sócios são seus filhos: Lincoln Cheib, que também é músico baterista e Ricardo Cheib, que é técnico do estúdio.

Castor Cartelle


por: Juliana Lima e Natália Vieira


Quatro décadas não foram suficientes para que Castor Cartelle perdesse o sotaque. Mas isso é apenas um charme a mais desse espanhol de fala mansa que veio para o Brasil aos 19 anos e construiu aqui um legado. O paleontólogo, responsável por importantes descobertas, foi idealizador e fundador do Museu de Ciências Naturais da PUC Minas, que conta com atualmente com 70 mil peças.

Sua paixão pela paleontologia não fascinou somente a ele. Um documentário sobre sua vida e descobertas está sendo produzido na França e já se encontra em fase final. O filme de 52 minutos será distribuído em televisões da Europa, Estados Unidos e Canadá. O professor aposentado da Universidade Federal de Minas Gerais ainda continua com suas aulas no curso de biologia da PUC, embora considere que ser pesquisador é que dá a ele maior prazer.

Na mesa desorganizada diversos objetos como papéis, canetas, livros e o crânio de um animal. É uma preguiça raríssima, extinta há muitos anos e desconhecida pela comunidade científica. “Eu imagino como ela era e tem vez que não consigo imaginar. Eu construo mentalmente o que tinha e o que não tinha, com quem parecia, do que se alimentava, como andava e onde andava. São perguntas que eu mesmo faço e eu mesmo tento responder de algo que ninguém sabe. Isso é incrível!”, se maravilha.

O pesquisador faz cada vez menos escavações e explica que isso não se deve somente a idade, mas a necessidade de organizar o material descoberto. O jovem senhor faz questão de mostrar sua força e dizer que só pretende se aposentar quando falharem as forças ou a cuca. E brinca: “Se falharem as forças eu vou perceber. Se falhar o cérebro outros vão perceber e delicadamente vão me dizer para botar o pijama”.

Muito da sua disposição pode vir da sua visão diferenciada do trabalho. Para ele as segundas-feiras são dias de diversão. Ele se incomoda de ter que desligar o computador porque é hora de ir para casa e se diz feliz quando precisa ir ao museu aos sábados. “Eu tenho a grande sorte que me pagam para trabalhar. Só que eu não trabalho, eu descanso trabalhando. Isso é impagável!”, avalia.

Mesmo com essa disposição para a paleontologia ainda sobra tempo para os outros projetos. Cartelle escreve livros infantis. O primeiro Os mamíferos do pleistoceno foi patrocinado pela Acesita e ele pretende reformulá-lo em breve. Sua segunda publicação Os meninos da planície foi adotado por várias escolas e está prestes a virar um filme de animação. O projeto está na fase de captação de recursos. Sua terceira e última obra, considerada por ele a melhor de todas, está sendo avaliada pelas editoras.

Esse homem de realizações tem sonhos bastante comuns, mas com propósitos diferenciados. Para fazer tudo o que quer ele calcula que teria que ganhar sozinho na loteria umas três vezes. Dentre seus projetos está um museu de arte popular de imagens barrocas do século XIX , uma publicação sobre os vertebrados de Minas Gerais e um projeto social que ele prefere não definir. Outro desejo não realizado é um filho. “Nós tentamos adotar um,umas duas ou três vezes, mas até hoje não quiseram. Vamos ver ou que Deus nos mande um”, confia.

segunda-feira, 4 de junho de 2007

A esquina que dobra o visível

Fábio Corrêa


Um quarteirão sujo e degradado. Alguns dizem ser uma região nobre aquela que abriga a barulhenta esquina entre as ruas Rio Grande do Norte e Santa Rita Durão. Para mim, um morador que não conhece a noção de lar a não ser dentro daquele perímetro, de nobreza, não vejo mais nada. Apenas os nostálgicos sopapos suaves de uma infância de peladas na garagem do vizinho e picolés de tutti-frutti na padaria da esquina.
Decorada com um gigantesco revólver tosco pichado de vermelho, é lá pelas horas do caos crepuscular que a padaria fica mais lotada. Na briga por uma satisfação tabagística, acotovelo-me na fila do caixa entre policiais montados – que, com seus animais estacionados, preenchem o ar do Bairro de perfume do campo –, alguns vizinhos conhecidos e outros forasteiros que nunca estiveram tão gordos à minha visão. Algo que um bolovo não pode, mesmo, resolver.

Na saída, um olhar de soslaio por sob o revólver artístico, e ali está mais uma vez aquela figura escusa, sentada sobre o para-chão, revolvendo discussões com outra figura que meus olhos não podem precisar. Incrivelmente, não há ninguém por ali, além de nós dois. O velho de barba por fazer e cabelos desgrenhados (me fez lembrar um velho professor de música, que dizia não existirem filhos de putas chamados Júnior e/ou mendigos carecas), continua a travar uma interessante discussão com a parede de mármore. Um transeunte desavisado passa exatamente na hora em que a figura se refere aos “grandes gigolôs estáticos”. Eu, um pouco mais afastado, fico tentando compreender como é possível tal anacronismo entre um mendigo que não possui um interlocutor numa hora e num lugar tão caoticamente habitado quanto aquela minha esquina. Com certeza, há alguém para receber seus perdigotos. E, com outra certeza, o fato de eu não o enxergar deve ser problema de inteligência.

Resolvo oferecer um cigarro, aquela velha ladainha de “o senhor aceita um cigarrinho aí sou aqui da região e vejo sempre o senhor aí sentado conversando mas não consigo ver com quem o senhor tanto fala”. Um frio “obrigado meu jovem”, acompanhado, é claro, do cigarro aceito, me deram um pouco de coragem. “Qual o nome do senhor?”, Heródoto responde, um pouco cabreiro. Mais uma tentativa, e olha que eu só tento três vezes: “poisé seu Heródoto, eu vi o senhor falando de gigolôs aí, e esse é um assunto que me interessa muito, já que meu pai foi um gigolô, meu avô era um gigolô e todos os primos do meu avô tinham algum puteiro em alguma cidade aqui perto”. Um olhar de surpresa, e a pergunta:

- E você, é um gigolô também?

- Não, eu não tenho vocação pra essas coisas não. Mal consigo segurar uma, imagina várias.

Sento ao seu lado. Heródoto continua a fitar fixamente os faróis de lava que jorram dos automóveis estáticos. Alguns momentos de hesitação, uma olhada pro lado e “é, Jeremias, o garoto gosta do assunto”. Suspiros. Um sinal de que tem alguém ali naqueles 12 centímetros entre Heródoto e a parede de mármore. Respondo, feliz, alegre, como um CDF aceito temporariamente por um grupo de punks. “Jeremias, é o nome dele? Mas eu não consigo ver, será que só pessoas inteligentes conseguem ver?”. Talvez, ele diz, o Jeremias é um pouco tímido e por isso gosta de se esconder por trás dos olhos de quem não conhece. Mesmo assim, se eu o conhecer, ele vai continuar a se esconder, pois sou uma autoridade no assunto que mais lhe interessa: Gigolôs.
Heródoto me explica, calmamente. Diz que frequenta aquela esquina há mais ou menos 10 meses. Fica ali de dia, e um pouco de noite, depois vai pro albergue onde pode tomar banho e comer sopa. Só alguns dias. Outros, perambula pela cidade atrás de “mé pra alimentar o cerebelo”. Ali, na padaria, os guardas não mexem com ele, os donos lhe dão café, pão velho e os fregueses cigarros, e ele pode muito bem continuar conversando com Jeremias. Mas, e Jeremias?

“Jeremias eu conheci quando era menino jovem lá nos lado do Maracanã e tinha que bater roupa todo dia na água salgada. A gente acordava seis e meia dez e meia pras três e aí vinha manter a situação do corpo de marinheiros do governo. Às vezes, saía um navio pro Amazonas e eu só via Jeremias 3 meses depois. Às vezes ia eu, às vezes ia ele, nunca os dois. Lá, era só cachaça e mulherada boêmia caindo de pau
Um tempo aí, Jeremias conheceu uma bela mulher objeto dos cantos do Pará. Falou que ela tinha dado pra ele maior insatisfação na vida de largar e chamar de vagabundo, dizer que mulher era pra rodar e conhecer os outros e depois dá tchau e ir caçar rumo noutro canto. Voltou pros Maracanã cheio de buracos embaixo dos óio e começou a maquinar uma companhia pra nós dois tocar.

Acho que Jeremias era que nem tu, Jeremias tinha pai, avô, bisavô, bisneto e as tias tudo no ramo do gigolô. Conseguiu emprego numa nave daquelas que vão pelas águas salgada levando umas caixa gigante de arroz milho e fubá pra China, e foi-se embora. Aí despois eu continuei lá na pedra pelada da água salgada um tempo ainda, mas já tinha ficado com a tentação no cerebelo pra gigolar demais. Então, caí nos mé e o chefe deu tanto tapa na minha cara que eu tive que sair com o rabo entre as perna num buraco de rato cheio de ratoeira. Aí eu fui andando até aparecer aqui. Aqui e ali, lá em cima nas praça, onde o povo dá pinga e dinheiro pra gente pingar mais. Aí teve um dia que tava passando aqui na padaria atrás dum fumo e Jeremias tava sentado aqui, cheio de prosa no papo. Uns anel de latão, uma roupa toda cheia de brilhantina, fiquei curioso e vim falar. Tamo aqui.”

Eu também tinha ficado curioso e vindo falar. Mas e aí, Jeremias voltou, da China, pros cegos e surdos. Heródoto discorreu sobre intensas experiências de Jeremias nas “casas de fumo e mulé”, onde conseguiu atingir o status de gigolô mestre ao vencer o dono numa luta de espadas. Até onde a memória me lembra, só faltaram pedaços de rim voarem pela boca de Heródoto. Jeremias devia ser um grandioso açougueiro.
“Jeremias continuou a crescer com as loja dele de muié e depois já tinha tomado o Japão a China e a Tailândia e as mulher tudo ali eram suas. Rodava as muié pros outro, e elas gostavam que era coisa de doido. E Jeremias só enchendo o bolso de trocado e muié e cachaça e fumo. Aí depois ele resolveu voltar na nave dos caixote, mas já era grande demais pra ter que pagar. Colocaram ele lá de graça e depois de tacar os gaivota na água salgada voltou e pegou as muié tudo. Ficou dando volta no mundo vendendo elas tudo quanto é coisa pras regata e os porta-avião que vinham fazer visita de homem seco pra ela no mar. Mas aí teve um pobrema. Jeremias começou a ter aquela queda de banguela que a gente tem na água salgada despois de muito minuto, e as velha ficaram velha, e a nave de caixote afundou e ele teve que vir nadando até aqui.”

Nadar até ali era impossível. “Nada, jovem, ele só foi nadando aí passou a China, a África, os Estados Unidos e aí chegou aqui pelo Arrudas mesmo. Mas ficou com tanta vergonha de voltar pra pobreza que resolveu se esconder dos outro. Num é Jeremias?”
Um pouco assustado pelos devaneios de Heródoto, acendi outro cigarro, e levantei-me para ir antes que o frio congelasse a minha espinha. Jeremias continuava escondido, mas Heródoto, mesmo visível, parecia mais ininxergável que o gigolô cosmopolita. E Heródoto, nada tinha a ver com o mundo dos gigolôs?
“Ah, sim. Gigolô. Eu sou um gigolô, sempre fui e sempre vou ser. O mundo é um puteiro, e alguém tem de cuidar dele. Eu sou gigolô dos homi, das mulé, das criança e dos cachorro. Mas de você não jovem, você já tem gigolô demais na sua família.”
Quem me dera, seu Heródoto, quem me dera...

quinta-feira, 31 de maio de 2007

Heleno de Freitas

por: Marina Toledo e Fabio Gruppi de Freitas

1939. Heleno de Freitas faz seu primeiro jogo pelo Botafogo de Futebol e Regatas. A historia que vêm antes disto não é muito diferente da de inúmeros garotos do interior que buscam em clubes da cidade grande uma chance ao estrelato. Claro, nessa época o futebol era muito diferente do atual, mais amador e com muito menos infra-estrutura, mas a paixão do povo pelo futebol já criava celebridades e uma serie de elementos que vêm agregados a esses mitos sociais.

Quando mudou de sua cidade natal, São João Nepomuceno, para o Rio de Janeiro, ele parece ter encontrado seu terreno. Em Copacabana começou jogando peladas na praia. Onde já causava impressão do que viria pela frente. Em um jogo, após uma jogada, ele começou a brigar com o nada, dando socos no ar. A atitude chamou a atenção de Neném Prancha, amigo e dono do time, que viu um futuro no jogador que apesar de ser esquentadinho, “comia a bola”.

Heleno virou ídolo no Botafogo, jogou pelo Vasco, Boca Juniors, seleção brasileira. A fama, dinheiro e a origem família de classe media, faziam de Heleno um jogador diferente dos outros. Era conhecido como “a elegância do futebol” ou “craque galã”. Formado em direito, sabia falar e freqüentava cassinos com a nata da sociedade. Era bem quisto por todas. E conquistava todos. Menos os que arrumavam confusão com ele. Heleno gerava o ódio de muitos. Ele brigava até com os companheiros de time. Não suportava o erro dos outros.

Em uma de suas brigas mais famosas, Heleno perdeu a chance de voltar a defender a seleção amarela. Flavio Costa, que fora técnico do Botafogo e conviveu algum tempo com a estrela, já não suportava o temperamento de Heleno e não mais o convocou.

Em um jogo amistoso em São João Nepomuceno, sua cidade natal, Heleno deu um soco na cara do adversário com poucos minutos de jogo e fora expulso diante de uma multidão que foi assistir a sua estrela maior jogar.

È esse misto de glamour e decadência que faz de Heleno de Freitas um homem com historia especial. Do que não vi em livros e reportagens houve pouco. Meu pai, Heraldo Filho, conta que quando já fora de si, Heleno o obrigava a sentar-se a sua frente para fingir que jogava gamão com ele enquanto ele mesmo jogava pelos dois.

Para mim, Heleno de Freitas sempre foi um jogador que os bem mais velhos lembravam e que era tio do meu pai. Ano passado, vagando pela internet li uma nota: “O diretor Zé Henrique Fonseca, diretor de “O Homem do Ano” vai dirigir filme biográfico de Heleno de Freitas. Rodrigo Santoro viverá o papel do jogador”. A partir daí também cheguei ao livro escrito por Marcus Eduardo Neves, repórter especial do Jornal dos Esportes: “Nunca Houve Um Homem Como Heleno”.

2007. Faz 48 anos que ele de Freitas morreu. E o garoto de 19 anos fez uma carreira de sucesso. Jogou 18 vezes pela seleção brasileira, fez 14 gols. Teve muitas mulheres, muitos amigos, se formou em direito, arrumou muita briga, ganhou muito dinheiro e muita fama. Terminou em Barbacena, sem mais conseguir viver em sociedade, em um mundo próprio, trancafiado em um sanatório e relembrando as glórias do passado.

Assista a um trecho de um documentário sobre Heleno de Freitas feito pela ESPN Brasil


quarta-feira, 30 de maio de 2007

O espalhador de Passarinhos

por: Clara Massote e Eduardo Drummond


Hugo Eiras Furquim Werneck tem nome famoso, inclusive, nome de uma importante praça na Região Hospitalar de Belo Horizonte. Mas o que pouca gente sabe é que o Hugo Werneck - o da praça, um dos fundadores da Faculdade de Medicina da UFMG e importante estudioso da tuberculose no início do século XX é, na verdade, pai do Hugo Werneck, o perfil desta reportagem.

Décimo primeiro filho de uma família de treze, Hugo (o filho) nasceu em Belo Horizonte em 1919. Seu pai viera à recém-inaugurada capital em 1906 para fazer um tratamento de tuberculose que deu certo, e resolveu fixar-se por essas bandas. Fundou um sanatório para tuberculosos, e se engajou no tratamento da doença, já que o clima de Belo Horizonte era, na época, propício para a melhora daqueles que sofriam desse mal.

Ao longo dos anos, Hugo, o filho, se apegou de tal maneira à cidade adotada por seu pai que, nas férias de verão, preferia ficar na capital a viajar com a família para o Rio de Janeiro. Passava seu tempo livre pegando passarinhos nas matas perto do sanatório de seu pai. E foi assim que despertou em seu jovem coração o amor pelo meio-ambiente, quando o assunto era ainda ignorado pela sociedade.

Formou-se em Odontologia aos 19 anos e atuou até os 80. Apesar de todo o carinho e dedicação pela profissão que escolheu, Hugo afirma que esta não era sua verdadeira vocação, mas sim a ecologia. Casou-se (e quase não se casou, em função de uma convocação para a guerra que nunca aconteceu) em 1942 com Wanda Azeredo, com quem teve 11 filhos que lhe deram 25 netos e 2 bisnetos.

Através de viagens pelas fazendas de amigos, Hugo começou a conhecer e se apaixonar pelo chamado Desertão, ou Sertão, o mesmo sertão mineiro que inspirou Guimarães Rosa em toda sua obra. Lá, no meio de matas e veredas, Hugo pegava passarinhos para que se reproduzissem em cativeiro e depois soltava os filhotes em áreas aonde aquela espécie já não estava presente. Um "espalhador de passarinhos", como afirma um de seus filhos, Humberto Werneck, em uma reportagem sobre o pai.

E foi assim, tocado pela harmonia essencial da natureza que Hugo começou a se engajar em projetos de conservação do meio ambiente e de educação ambiental. Fundou, com amigos, o Centro de Conservação da Natureza, primeira Organização Não Governamental a tratar do assunto no estado. Ao longo de sua trajetória, trabalhou em inúmeros projetos relacionados ao meio ambiente, como ocupar a presidência da Fundação Zoo Botânica de Belo Horizonte, tendo fundado, em exercício, o Borboletário dessa instituição.

Atualmente, Hugo é conselheiro de várias iniciativas relacionadas à preservação da natureza, como na Belgo Mineira, na Odebrecht e no Ministério do Meio Ambiente. Mas a grande lição de Dr. Hugo Werneck será sempre a de observar e respeitar a frágil filosofia da natureza para aprendermos a viver melhor em sociedade.

Apaixonado por carros

João Victor Leite e Marcelo Zicker

Arlindo Gonçalves, o “Seu Arlindo”, tem 72 anos e é um exemplo de vida. Quatro vezes por semana, ele acorda cedo e, com a ajuda dos netos, sai pelas ruas do bairro Dom Cabral, Califórnia e João Pinheiro para vender verduras e fazer novos amigos. Arlindo reconhece que não tem mais ânimo para andar todos os dias e que o dinheiro das vendas não é lá grande coisa, mas reencontrar as antigas amizades e passar mais tempo com os netos vale o sacrifício.

Capixaba de Vila Ibituba, distrito de Baixo Guandu, o vendedor mora a 37 anos no bairro João Pinheiro e divide o mesmo lote com mais seis famílias, todas formadas por seus filhos e netos. Ele se alegra por ter uma família grande, casado há 52 anos com Valmerinda Gonçaves da Silva, o casal possui 13 filhos, 31 netos, dois netos adotivos e dois bisnetos.

Arlindo é aposentado e recebe um salário mínimo por mês. Encontrou nas verduras um meio de completar a renda da casa e continuar seu antigo hobby, colecionar carrinhos de brinquedo. “Desde pequeno eu guardava todos os carrinhos que meu pai fazia para mim, cuidava com tanto carinho que eu nem deixava os outros meninos usarem”, diz.

Sempre que pode, Arlindo compra mais um carro para a sua frota. É só ver um carrinho numa vitrine ou banca que ele logo se apaixona. “Os que eu mais gosto são os caminhões, eu tenho um monte. O problema é que nem sempre tenho dinheiro para comprar mais. Eu queria era comprar todos”, fala.

Hoje sua coleção chega a mais de 200 tipos de miniaturas. São carros de todos os tamanhos e modelos, mas um é especial para ele. “Ainda tenho um carrinho que meu pai me deu quando eu completei 12 anos, esse meus netos nem podem chegar perto”, conta o aposentado com alegria.

A paixão por carros do aposentado vem desde pequeno. Aos dez anos de idade ele já ajudava a família nas ocupações da roça, guiando “carro de boi”. Já foi caminhoneiro, tratorista, taxista, motorista de ônibus, e sempre um entusiasmado por carrinhos de brinquedo.

Arlindo espera que os netos sigam o exemplo do avô e dêem continuidade a sua coleção. “Meus filhos nunca deram confiança para carrinhos, o negócio deles era jogar bola. A minha esposa sempre me avisou que carrinho é coisa de menino. Ainda bem que tem netos meus que adoram os meus brinquedos”, disse.